DIVULGAÇÃOA jornalista Ariadne Gattolini durante a aventura "O céu de Ícaro tem mais poesia do que Galileu" (Herbert Vianna)
Ícaro é o meu mito predileto na Mitologia Grega. Quando seu pai, Dédalo, lhe ofereceu asas de cera para fugir do labirinto, ele ficou tão maravilhado com a experiência de voar, que se esqueceu que as asas derreteriam. Ícaro não teve medo - ousou seguir seus sonhos - e a experiência única. Com a coragem do mito em mente, parti para a minha experiência de voo à vela, com planador. Acompanhou-me na aventura Fabiano Maia, que fotografou o planador em que eu estava de outra aeronave, em um voo ´paquera´.
O dia estava lindo, era domingo de manhã. Ventava muito e o ritmo do Aeroclube Politécnico de Planadores de Jundiaí, ao lado do Aeroclube, era frenético. Após me apresentar no hangar, sou levada até a cabeceira da pista por um buggy. Um bom time de solo garantia a rapidez necessária para coordenar as aeronaves: três planadores e duas aeronaves motorizadas. Estas aeronaves são as responsáveis para colocar os planadores em voo e se utilizam da mesma pista do Aeroporto Rolim Amaro. Portanto, o trabalho tem de ser eficiente e rápido para não prejudicar os pousos e decolagens.
Antes de partir, o primeiro susto. Teria de usar paraquedas. Após sua colocação, recebo as instruções básicas, enquanto descobria o funcionamento operacional e as instruções sobre o painel à minha frente, já que o piloto ficaria atrás. Fico sabendo também que só temos permissão para voar a oeste do aeroporto - sobre a Serra do Japi - até o bairro do Jacaré, em Cabreúva, com altura máxima de 1,4 mil metros. Através de um rádio, os pilotos recebem autorização da torre de controle. Iremos decolar contra o vento. Nosso rebocador está a postos e decolamos em uma curta distância, delicadamente, sem quase perceber. Quando atingimos a altura de 900 metros, um barulho alto nos avisa que nosso rebocador nos abandonou. Estamos por conta do vento.
Silêncio - A sensação de estar voando é libertadora. Na cabine, somente o barulho do vento e o rádio. Mesmo assim, me sinto desconectada do mundo. Lá embaixo, vejo a Serra do Japi preservada, apesar de seus inúmeros imóveis particulares. À direita, o observatório construído por Kiko de Matheo na década de 1980. Jundiaí, lindíssima, ficou para trás. O piloto Paolo Rossi, que está comigo, voa em planadores desde 2007. Antes, voava de asa delta. O nascimento do filho o fez procurar um esporte mais seguro. Escolheu planar. Levou um ano para se formar em pilotagem. "Mas este tempo depende da dedicação e o desempenho do aluno", ensina. Este publicitário mora em Atibaia, mas aos finais de semana trabalha voluntariamente no Aeroclube de Planadores. Por puro prazer. Em um domingo como este, eles fazem de oito a dez voos panorâmicos. No restante do tempo, pilotos e alunos se revezam no esporte.
Nossa busca, agora, durante nosso voo, está em encontrar uma térmica. É ela que nos permite ´planar´ por até cinco horas. Com ela, ganhamos altitude. Paolo explica que cada térmica é como se um carro parasse para abastecer, dando autonomia ao voo. Experiente, ele descobre uma próxima à Serra do Japi. O variômetro (que mede a altitude) sobe, mostrando que ganhamos altitude. Neste momento, Paolo pede para que eu comande a pequena aeronave.
Segurei o manche e fui insensível, lógico. O avião embicou para o chão. Entrei em pânico. Ao mesmo tempo, Paolo fez uma curva à esquerda. Consciente da minha incompetência, pedi para que ele retornasse à pilotagem. Enquanto aguardamos autorização para pousar, Paolo me dá uma aula da importância dos planadores. "Em Pirassununga, os alunos da academia começam a voar por ele. Na Alemanha, também. Ele nos treina a previsibilidade - já que temos de estar atentos a todas as situações e corrigir rapidamente nosso plano de voo."
Pergunto se qualquer pessoa pode fazer o curso. Ele me diz que sim. Mas que pessoas que não conseguem traçar objetivos e prever problemas, ou seja, quem não tem, como eles dizem, a chamada ´consciência situacional´, o abandonam. Neste momento, começo a me preocupar com o pouso. Ele me diz que voará perpendicular à pista e, em uma perna de vento, fará uma curva em 90º e entrará na pista. Fiquei esperando um pouso longo, como de um avião de pequeno porte. Isso não aconteceu. Pousamos tranquilamente e rapidamente temos de deixar o planador para desobstruir a pista. Meu coração está na boca. A adrenalina, a mil. Não tenho consciência de onde estou. Aterrissei só de corpo, mas minha alma continua lá em cima.
No solo - Estudantes, administradores de empresas e profissionais liberais ficam no solo, orientando todo o trabalho. A sincronia e o trabalho em equipe deixariam qualquer coach boquiaberto. José Hélder de Sá, chefe de pista, explica que as funções são determinadas e todos têm seu suplente. Embaixo de um guarda-sol ficam duas pessoas que são responsáveis pela documentação do plano de voo. Dois pilotos do avião estão a postos. Outras duas pessoas são responsáveis pelo tobata, que retira as aeronaves da pista. Outros, se responsabilizam pela conexão da aeronave aos rebocadores. Vários pilotos revezam-se nos voos. O ritmo é alucinante. "Aqui é o nosso spa", brinca Helder.
A dentista paulistana Ligia Maria Gallello é uma das alunas. Interessou-se pelo esporte quando deu um voo de presente de aniversário para o marido. Desde então, frequenta Jundiaí aos finais de semana para ouvir o som do vento. "É um voo primitivo, por isso ficamos alucinados pelos planadores." O presidente do Aeroclube Politécnico de Planadores, José Eduardo de Faria, explica que a instituição sobrevive das mensalidades de seus sócios, dos voos panorâmicos e das aulas-voo de seus alunos. Atualmente, são 150 alunos. "Para começar, basta fazer a inscrição e um exame médico", afirmou.
O almoço da turma do ´spa´ chegará pelo buggy, que me leva de volta. Não há tempo para a pausa. Só posso dizer uma coisa: o voo vicia e, quando você chega ao solo, já pensa em estar lá em cima novamente. No hangar, meu filho Ícaro me espera, orgulhoso. Um dia, voará com suas próprias asas.
ARIADNE GATTOLIN |
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