segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Meu Primeiro Campeonato de Planadores

Terceira geração do clã volovelista Schubert, Flávia nos brinda com este lindo relato do primeiro campeonato dela, voado em Bebedouro 2008.

Estou aqui fazendo um esforço para escrever algo pós-campeonato aos amigos que lá encontrei e aos que não foram lá, mas de alguma forma acompanham minha vida. (escrever não é uma das coisas que faço com facilidade na vida)
O meu primeiro campeonato de vôo a vela terminou com um saldo muito positivo, não por ter ganho alguma prova mas por ter aprendido muita coisa que não se aprende voando em casa. 
A primeira experiência nova que tive foi rodar térmica com mais de dois planadores, fora o meu. Realmente não me senti confortável no primeiro dia, tanto que nem entrei nos paliteiros (térmica com diversos planadores rodando - explicação aos amigos terrestres). Procurava sempre uma termiquinha marginal, que não subisse tanto mas que eu pudesse rodar tranquilamente...às vezes ela ficava melhor e os planadores acabavam migrando para ela....logo eu ia procurar outra e deixava o filé para os demais. No meu segundo dia de prova me determinei a enfrentar a situação, afinal é impossível voar um campeonato rodando zerinhos sozinha ou não dividindo os "canhões". Consegui. É verdade que até o último vôo em Bebedouro a minha confiança oscilava, tinha dia que eu rodava com os demais numa boa, tinha dia que eu preferia me mandar. Tudo influenciado pela característica da térmica e pelos outros pilotos...e porque não considerar também o meu espírito...tem dia que você está bem...tem dia que nem tanto...e tem aqueles que definitivamente você não deveria sair do chão. Mas posso considerar que o medo do paliteiro eu venci, o respeito eu espero manter para sempre.
Depois de conseguir subir eu precisava tomar coragem e me afastar da pista, no primeiro dia saí 10 km e voltei, achando que só existia térmica em volta da pista em Bebedouro. No dia seguinte resolvi seguir a "mamãe ganso" ou "papai uno", que na verdade era meu pai voando o P1...lá fui eu.

A segunda barreira que rompi durante o campeonato foi o pouso fora. Voando há 3 anos, praticamente sempre no cone (novamente aos amigos terrestres: estar sempre com uma altura e distância que me permitam voltar para à pista de onde decolei) de Ipuã nunca tinha passado por esta experiência, que foi das mais tranquilas tenho que admitir. Após voar atrás da "mamãe ganso" ou "papai uno" quase que a prova toda me aventurei a tomar minhas decisões... não fui muito longe. Fiquei baixo ao lado da pista de Bebedouro, estava decidindo pousar quando a 400 m achei um canhão e consegui subir novamente a 1300 m...agora vai, pensei eu...e fui, na direção de Olímpia, o último ponto desta prova. Mas no meio do caminho não achei mais térmicas (provavelmente algumas delas ainda estavam lá, mas faltou braço e capacidade para localiza-las à manicaca aqui). Como eu estava andando sem achar nada já ia olhando para o chão o elegendo possíveis arados. Quando o GPS acusou um planeio de 21:1 para voltar à pista dei meia volta...e acertei em cheio o caminho das descendentes....a pista ficava cada vez mais alta e aquele arado previamente escolhido começou a se tornar uma necessidade. Para alívio dos que me observavam na pista fiz uma curva e por ali fiquei...a 4,5 km da cabeceira 13 de Bebedouro. Lá recebi a visita dos Rurais, tratoristas e moradores das casinhas em volta...que muitas vezes exclamavam boquiabertos: "É muié..." ao me ver saindo do planador. A explicação usada para diminuir a curiosidade dos visitantes que queriam saber porque eu "caí" ali era a padrão: Acabou o vento! Além de aprender que não é o fim sair do cone em uma região rica em opções de pouso aprendi que passar as coordenadas do GPS para o resgate não é a única coisa necessária para voltar para casa. O tempo do resgate é inversamente proporcional à quantidade de informação que você consegue obter com os locais referente a como chegar no local. Apesar de estar a 4,5 km da pista, meu resgate levou mais de uma hora para chegar e se meu celular fosse pré-pago teria consumido meus créditos.

O pouso em arado me deixou mais confiante para me afastar da pista, e no dia seguinte saí para a prova sem a "mamãe ganso". Consegui entrar na área de todos os pontos...mas na volta do último ponto, Olímpia de novo, eu não achei mais nada e novamente selecionei um belo arado, desta vez na beira de uma rodovia asfaltada (tava ficando esperta) a 20 km da pista de Bebedouro. Pousei, procurei um pessoal que trabalhava ali perto para saber que estrada era e liguei pro papai uno: gostei! to no arado de novo! Desta vez peguei todas as referências para o resgate me achar rapidamente...só que os salvadores estavam tão afoitos para fazer o primeiro resgate em arado deles que saíram antes de receber as dicas da estrada...tinham em mãos apenas as coordenadas. Os tratoristas terminaram o trabalho, foram embora, os rurais iam embora, a polícia que passeava pela estrada veio ver o que se passava, e nada do meu resgate...consegui o telefone deles e descobri que estavam a 15 km...fiquei tranquila que logo eles estariam por ali...passada mais de meia hora nada...liguei novamente e eles estavam a 4 km....mais meia hora e estavam a 3 km....neste momento tinha certeza de que eles haviam pegado o caminho errado ou estavam a fim de um resgate noturno e portanto pararam no meio do caminho esperando o por do sol. Até que enfim chegaram...vieram pelo meio dos canaviais, abrindo porteiras, cortando cercas (aproveito para me desculpar aos fazendeiros prejudicados), passando dentro de plantações de seringueiras, numa linha reta desde a estrada que passa em frente ao aeroclube até o ponto onde eu me encontrava. Colocamos o Junior na carreta minutos antes do por do sol. Dias depois soube que deu na rádio local que suspeitaram que um OVNI havia pousado perto de Colina, mas que no fim a polícia verificou que era um planador...acho que a ET era eu.
Esses pousos no arado me renderam o troféu arado mais bonitinho dos campeonatos no Brasil, um trator puxando um arado que agora se encontra na sala de briefing do CVV-CTA em Ipuã.
Na prova de clube realizada entre as duas etapas finalmente consegui completar um prova e bater meu recorde de distância em navegação, foram mais de 160 km. Nada comparado às marcas já alcançadas no vôo a vela mas uma satisfação pessoal. Tanto pela distância voada quanto pelo retorno ao aeródromo de decolagem.
Na segunda etapa do campeonato dividi o JU (terrestres: prefixo de competição do planador que voei, o Junior) com o Rafael, colega de clube e também estreante em campeonatos que também fez bom proveito completando as provas por ele voadas (pegando 4° lugar na primeira delas) e fechando com chave de ouro em um arado perto de Taiuva num dia em que ninguém conseguiu completar uma prova.
Por essas e por outras o campeonato foi uma experiência muito legal para mim, além da oportunidade de rever e fazer amigos. No próximo espero conseguir completar mais provas, e quem sabe de brinde aumentar as distâncias voadas e as médias de velocidade.
Agradeço a todos que trabalharam para a realização deste campeonato e que dividiram as emoções comigo torcendo ou compartilhando experiências! 

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns para Flavia pela rica experiência. Achei um relato muito lindo pois deu me para entender quanto ela tem aprendido nos voos do campeonato e que foi à vez de uma forma muito prazerosa.
Que a nova era pós Bebedouro seja igualmente rica. Bons voos.

Daniel